Japão reduz violência a quase zero fazendo o oposto do que pregam Bolsonaro e Moro


Koban, polícia comunitária Japão

O estímulo ao uso de armas e a guerra às drogas, que torna o Brasil um dos países mais violentos do mundo, estão na contramão da política de segurança do Japão


Só para um pequeno exercício de comparação entre Brasil e Japão em números. Em 2017, o Brasil teve 63.880 mortes violentas, o maior índice da história. No Japão houve, em 2017, apenas 22 crimes cometidos com armas de fogo - deixando 3 mortos e 5 feridos.

A política de segurança pública de Bolsonaro e Moro é de mais enfrentamento e armamento da população. No Japão, proibição de armas, policiamento ostensivo e educação.
 A tecnologia ajuda, mas, no Japão, não são os sensores e as câmeras os principais responsáveis pela segurança pública. É uma combinação bem-sucedida de leis rigorosas, policiamento preventivo, ações comunitárias e educativas que têm garantido ao país uma posição de destaque entre os lugares mais seguros do mundo.

Em 2018, os japoneses tiveram o 9º melhor Índice Global da Paz (ranking liderado pela Islândia), enquanto os brasileiros amargaram a 106ª posição, com altas taxas de criminalidade e corrupção. De acordo com o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crimes, o Japão tem 0,28 homicídios para cada 100 mil habitantes.

No Brasil, em 2017 (dado mais recente no comparativo), foram contabilizados 63.880 mortes violentas, o maior índice da história. Isso equivale a 30,8 homicídios para cada 100 mil pessoas.

Apesar das pequenas oscilações no passado desses indicadores, os japoneses hoje conseguem dormir tranquilos graças à segurança proporcionada pela política de tolerância zero às armas e ao centenário sistema de policiamento comunitário, com mais de 6.600 postos espalhados pelo país - os chamados Koban, nome dado aos pequenos postos onde residem e trabalham de dois a três policiais treinados para servir a comunidade e dar informações de segurança, inclusive sobre objetos perdidos.

"No Japão, as crianças aprendem desde cedo que é crime ficar com aquilo que não é seu. Não existe isso de dizer que 'achado não é roubado'", observa Mayumi Uemura, diretora de uma escola brasileira no Japão - instituições de ensino particulares que são homologadas pelo Ministério da Educação brasileiro e seguem o currículo brasileiro, em áreas de grandes concentrações de migrantes do Brasil.

A escola dirigida por Uemura fica em Joso, cidade com pouco mais de 2 mil brasileiros localizada na província de Ibaraki (que tem cerca de 6 mil brasileiros. E os estudantes são frequentemente convidados para participar de atividades com a polícia, como palestras sobre drogas e até campeonato de futebol promovido por policiais.

Os alunos também passam por treinamento sobre regras de trânsito. "Muitos brasileiros não sabem que aqui é proibido carregar alguém na garupa da bicicleta", diz a diretora. A lei para ciclistas é de 2015 e pune com multas e prisão quem for pego pedalando alcoolizado. Também proíbe pedalar com fones de ouvido, mexendo no smartphone ou equilibrando um guarda-chuva.

Policiamento humanizado e sistema unificado sem rivalidades 

A segurança pública do dia a dia é garantida por um contingente de 290 mil policiais. São eles que mantêm o laço de confiança da população com a polícia pelo sistema Koban.
O sistema, criado em 1874, é a resposta japonesa para a criminalidade, e a intenção é de que seja implantado em localidades brasileiras, por um Acordo de Cooperação Técnica entre Brasil e Japão.
No entanto, na opinião de um policial japonês que fez estágio na polícia brasileira e não quis ser identificado na reportagem, a implantação do modelo japonês no Brasil será complicada devido às diferenças entre os países.
No Japão repleto de leis rigorosas, não é de estranhar que policiais façam suas rondas ostensivas de bicicleta e abordagem sem o uso de armas de fogo, recorrendo apenas a movimentos de artes marciais ou até mesmo redes e cobertores quando é necessário conter um suspeito.
"Enquanto no Japão a Agência Nacional da Polícia é a única a coordenar o sistema, no Brasil há várias instituições policiais, como a civil, a militar e a federal, e elas estão sempre se enfrentando", diz o policial japonês.
O segredo para o modelo japonês dar certo, opina ele, é a integração da polícia com a comunidade: "respeito mútuo".
Os estrangeiros também interagem com a polícia. A brasileira Bruna Ishikawa, de 14 anos, foi escolhida para ser policial por um dia e percorreu de viatura um trecho entre as cidades de Joso e Ishige enquanto falava pelo alto-falante - em português, para ser entendida pelos membros da comunidade brasileira - sobre a necessidade de os pedestres olharem sempre para os dois lados ao atravessar a rua. "A polícia daqui é diferente. A gente respeita", diz a estudante.

 Sociedade participativa e qualificação dos policiais

Os próprios cidadãos ajudam o policiamento no Japão. Em muitas casas e lojas, há um adesivo escrito "Kodomo 110ban no Ie" colado na porta, indicando que o local pode ser usado como abrigo por crianças em perigo. E todos os alunos do equivalente aos seis primeiros anos do ensino fundamental brasileiro levam pendurado na mochila um alarme que é usado em situação de ameaça.

Para ajudar a população a memorizar o telefone de emergência, a polícia japonesa criou o Dia do 110. Sempre em 10 de janeiro, realiza eventos para lembrar as pessoas que o número 110 deve ser usado para acionar a polícia por telefone em caso de crime, acidente ou uma ocorrência suspeita.

A Academia Nacional de Polícia tem investido em transformar parte de seu contingente em policiais poliglotas, para dar suporte à crescente população estrangeira e ao público esperado em megaeventos, como os Jogos Olímpicos de Tóquio 2020.

Mais do que à gramática, o professor de português Miguel Kamiunten dá ênfase à conversação, ensinando inclusive gírias e termos técnicos jurídicos. "O importante é que esses policiais poderão ajudar no trabalho preventivo, passando informações de segurança aos estrangeiros", explica. 


Segurança no trânsito e penas duras

Os motoristas também foram obrigados a redobrar a atenção, porque acidentes de trânsito costumam ter punição severa. O Japão criou a rigorosa legislação em 1970, quando houve um brusco aumento da frota de carros em circulação - e 16.765 mortes nas estradas. Após campanhas intensas e queda nos números, os casos fatais voltaram a superar a marca de 10 mil em 1988, devido ao maior número de pessoas habilitadas e motorizadas.

O país recorre a casos emblemáticos para criar precedentes e dificultar ainda mais a violação do Código Penal. Em dezembro passado, um homem foi condenado a 18 anos de prisão por direção perigosa seguida de morte. O réu perseguiu o carro de uma família e, depois de ultrapassá-lo, forçou a mulher e o marido dela a pararem o veículo no meio da via expressa, quando foram então atingidos por um caminhão.

A "lei seca" surgiu após outro episódio de grande repercussão nacional, ocorrido em 2007. Um motorista embriagado provocou a morte de três crianças no trânsito, motivando o endurecimento da legislação.

Casos em que gerentes de bar ou amigos servem álcool sabendo que a pessoa vai dirigir, ou mesmo pegar carona ou emprestar carro a alguém alcoolizado, podem resultar em prisão de todos os envolvidos. Outras violações das leis de trânsito podem levar à perda imediata da carteira, pagamento de multa e até prisão.


O difícil caminho para comprar armas no Japão

Se você quer comprar uma arma no Japão é preciso paciência e determinação. É necessário um dia inteiro de aulas, passar numa prova escrita e em outra de tiro ao alvo com um resultado mínimo de 95% de acertos.

Também é preciso fazer exames psicológicos e antidoping.

Os antecedentes criminais são verificados e a polícia checa se a pessoa tem ligações com grupos extremistas.

Em seguida, investigam os seus parentes e mesmo os colegas de trabalho.

A polícia tem poderes para negar o porte de armas, assim como para procurar e apreendê-las.

E isso não é tudo. Armas portáteis são proibidas. Apenas são permitidos os rifles de ar comprimido e as espingardas de caça.

A lei também controla o número de lojas que vendem armas.

Na maior parte das 47 prefeituras do Japão, o número máximo é de três lojas de armas e só se pode comprar cartuchos de munição novos se os usados forem devolvidos.

Até mesmo o crime organizado no Japão dificilmente usa armas de fogo. Geralmente, os criminosos utilizam facas.

A polícia tem que ser informada sobre onde a arma e a munição ficam guardadas - e ambas devem estar em locais distintos, trancadas. Uma vez por ano a polícia inspecionará a arma.

Depois de três anos, a validade da licença expira e a pessoa é obrigada a fazer o curso e as provas de novo.

Tudo isso ajuda a explicar por que os tiroteios e massacres com armas de fogo são muito raros no Japão.

Quando um massacre ocorre no país, geralmente o criminoso utiliza facas. [BBC]

É possível uma política de segurança sem uso da violência, ou com uso mínimo dela, mas bastante investimento em tecnologia e, principalmente, educação. Oposto do que Bolsonaro e Moro querem aprofundar no Brasil.



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