segunda-feira, 24 de outubro de 2005

Falta uma CPI

Reportagem no Jornal do Brasil desta segunda denuncia que companhias brasileiras criaram pelo menos 300 empresas em paraísos fiscais para lavar dinheiro, ocultar patrimônio ou enganar o Fisco.
Procurados pela Polícia Federal, alguns dos empresários confessaram o crime e estão dispostos a pagar pelo prejuízo.
Até aí, como diziam os antigos, morreu o Neves. Mas o fato é que tudo isso aconteceu e continua acontecendo por conta da “abortada” CPI do Banestado.
Para quem não está ligando o nome à coisa, esclareço: a CPI do Banestado estava investigando mutretas com as CC-5, contas assim chamadas porque foram criadas por uma carta circular n° 5 do Banco Central.
As CC-5 não permitiam fazer movimentação em dinheiro do Brasil para o exterior, e vice-versa, acima de R$ 10 mil. Até que no governo FHC o Banco Central estabeleceu uma autorização especial para movimentação acima desses valores, alegando que a finalidade era facilitar o repatriamento dos dólares movimentados na fronteira Brasil-Paraguai.
Apenas cinco bancos foram autorizados a fazer essa movimentação: Banco do Brasil, Banco Real, Banestado (que era o banco do estado do Paraná), o Bemge (banco do estado de Minas Gerais) e o Araucária.
Se os outros eram ou megabancos ou banco médios, o Araucária...bem, tinha duas agências, uma em Curitiba e outra em Foz do Iguaçu, num andar alto. Por que ele entrou na autorização, em meio a bancos graúdos, não sabemos, já que a CPI ficou pelo meio do caminho. Mas dizem que é um banco relacionado à família de um famoso senador por Santa Catarina...
Acontece que, a partir dessa autorização, o uso das CC-5 explodiu. Dinheiro vinha do Brasil todo, “passava” por Foz, ia e voltava, numa lavagem fenomenal que atingiu a cifra espantosa de 75 bilhões de reais. O que, ao câmbio de hoje, dá mais de 30 bilhões de dólares.
Em entrevista à revista Caros Amigos de setembro, o procurador da República Vladimir Aras declarou que a desfaçatez chegou a tal ponto que carros-fortes saíam de uma agência de banco em Foz do Iguaçu, davam uma volta na praça e retornavam, fingindo que haviam ido até o Paraguai. Levavam o dinheiro para passear e ele voltava limpinho, incrível, não?
No entanto, apesar – ou por causa – desse vasto material colhido pelo Ministério Público, a CPI deu em nada. Muitas acusações foram feitas – inclusive ao relator e ao presidente dela –, mas o resultado foi nenhum.
Por que o PT, que vive se dizendo perseguido pelas CPIs dos Correios e dos Bingos, não reabre a do Banestado? Será que ela está funcionando como moeda de troca? Ou o PT também tem rabo preso aí?
O final inconcluso da CPI do Banestado dá a impressão de que “neste país” (para usar a expressão favorita do “nosso presidente”) não têm nada a ver “lé” com “cré” nem “u” com “alças”, quem nos governa é a lei do “andar de cima”, que diz que “uma mão lava a outra e as duas lavam o rosto” – ou seria o resto, ou o rasto?...

Um comentário:

  1. Anônimo30.10.05

    Mello, essa farra cambial começou bem antes. Em 1993, o então ministro FHC produziu uma cartilha explicando como fazer para os residentes (as CC-5 só podiam ser usadas por não-residentes) enviar dólares ao exterior. Em um tópico desse documento, o Príncipe estatuiu que bastava fazer o depósito em moeda nacional na conta de um banco estrangeiro com conta em um banco brasileiro credenciado. E esse banco estrangeiro fazia o resto. Não é um primor de sofisticação? Nobel de economia para FHC? O próprio mercado financeiro estranhou tamanha generosidade. Isso ninguém tira de Dom Fernando. Ele é um homem muito generoso. O mercado alcunhou o documento de "Cartilha da Sacanagem Cambial". Nesse período - de 93 a 2002 - calcula-se que foram enviados ao exterior mais de 80 bilhões de dólares. Isso gerou mais de 10.000 processos na Justiça Federal. Tucanos de alta plumagem estão no polo passivo. Gustavo Loyola, Gustavo Franco, Ricardo Sérgio de Oliveira e outros diretores de bancos. Dê uma googlada com o tema Cartilha da Sacanagem Cambial e você encontrará farto material para publicar aqui no seu blogue. Abraços!

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