Quando chegará o Sábado de Aleluia do verdadeiro Judas do Brasil?

Na minha infância, o Sábado de Aleluia era esperado pela molecada, não pelo significado religioso, mas pela malhação de Judas, uma cerimônia que nos tomava tempo, em que discutíamos quem seria o "homenageado" e como faríamos o boneco do Judas.

Geralmente o nosso Judas era alguém que não devolveu a bola que caiu no seu quintal. Ou, dessa me lembro até o nome, dona Zizinha, que tinha uma casa grande com um quintal enorme com vários tipos de mangas: espada, carlotinha, coração de boi, além de goiaba branca e vermelha. E dois cachorros muito ferozes, que ela deixava soltos para que não pudéssemos pegar as frutas, que apodreciam no pé ou caíam no chão.

Todos tinham que procurar em suas casas um terno velho, uma camisa e uma calça sem uso. Ou uma saia ou vestido, se fosse uma mulher. Num Sábado de Aleluia de fartura, até sapato o Judas tinha. 

A cabeça era em geral feita com uma daqueles meias de nylon femininas, usadas na época, que nem sei se ainda existem hoje, recheada com panos para formar o rosto. Alguém com essa habilidade pintava os detalhes: olhos, nariz, boca. Barba e/ou bigode, se o "homenageado" tivesse. Se fosse uma mulher, ainda arrumávamos um jeito de colocar um cabelo feito de réstias de cebolas. Como arremate, prendíamos um cartaz com o nome do "homenageado".

Tudo isso para ser pendurado no poste, numa altura que desse pé para que alcançássemos o boneco com pedaços de pau e o espancássemos com vontade, antes do momento final, em que ateávamos fogo naquele boneco que nos deu tanto trabalho construir.

Hoje, com certeza, vários meninos e meninas pelo Brasil estão malhando seu Judas, como eu fazia na minha época.

Mas o verdadeiro Judas do Brasil segue impune, ainda não conheceu seu Sábado de Aleluia. Não para ser malhado e queimado, apenas preso para pagar por todos os seus inúmeros crimes.

O Judas do Brasil esteve no poder para cuidar do Brasil, mas ele só fez destruir, como anunciou que faria no primeiro mês de governo. Que zombou dos mortos por COVID. Imitou sorrindo os que morreram por falta de oxigênio, que seu governo não providenciou. Espalhou a doença criticando o uso de máscara. Pregando contra as vacinas. Defendeu a milícia e a armas para a população, insuflando a violência. Contra a mulher, os indígenas, os trabalhadores — a quem acusava de serem um peso no ombro dos empresários.

Perto desse criminoso os Judas de minha infância eram inofensivos, como dona Zizinha, a quem um dia ajudei a carregar suas bolsas pesadas de feira e ela, a partir dali, passou a distribuir mangas e goiabas para a molecada — sem, no entanto, deixar que as pegássemos nos pés.

O Judas do Brasil se jacta de seus crimes achando que vai ficar impune como ficou por toda a sua vida de crimes, desde a época em que no Exército tinha um plano de explodir bombas em quartéis.

Por isso, nessa Semana Santa ainda cabe a pergunta: Quando chegará o Sábado de Aleluia do verdadeiro Judas do Brasil?

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