Você me pergunta se te amo, morena

Você me pergunta, morena, se te amo, eu gostaria de dizer que não, mas, sim, amo e não deveria, porque, morena, ai, morena, não são apenas os celulares, os televisores, os automóveis, as geladeiras, máquinas de lavar, nós humanos também somos vítimas da obsolescência programada, nascemos para durar um certo período de tempo, morena, e assim, quando se chega à minha idade, mais ou menos, morena, já passamos há muito do fio, do ápice da vida, que é ali pelos 30 anos, morena, e depois dessa idade o corpo começa a falhar, já não há mais o mesmo desempenho, não é como a Lâmpada Centenária, que está acesa desde 1901 e se mantém assim, na cidade de Livermore, na Califórnia, enquanto as nossas lâmpadas, nossas baterias, as baterias de nossos celulares não duram quase nada, porque são programadas para serem assim, perecíveis em xis tempo, como nós, que não passamos dos 120, talvez alguns, mas a imensa maioria não chega nem a isso, porque nosso corpo foi programado lá atrás no DNA, e as células começam a morrer, especialmente do fígado, dos rins, e ai, morena, sem os rins e o fígado para filtrarem as merdas todas que ingerimos em vida, como poderemos sobreviver, morena, como posso alongar a vida do meu coração, que gera energia a vida inteira, morena, a energia gerada pelo coração em um dia conseguiria levar um caminhão por 30 quilômetros, e o que carregaria esse caminhão morena?, e quantos caminhões carregamos pela vida com nosso louco coração batendo, morena, daria para ir até a Lua, somados todos os dias em que ele bate sem cessar, dia após dia, hora após hora, daria para levar um caminhão à Lua só com a energia gerada por nosso coração, ainda mais, morena, quando chego perto de você, morena, quando ouço sua voz, morena, e quando você me pergunta com esse sorriso enviesado de quem sabe a resposta e quer apenas a confirmação se eu amo você, morena, como não amar, morena, mesmo correndo o risco de acabar desabastecendo o caminhão, fazendo com que ele não chegue a seu destino, porque, morena, você acelera meu coração de uma maneira, que eu me sinto quase como um feto, cujo coração chega a bater 150 vezes por minuto, o dobro de um adulto, imagina, morena, estou muito longe do feto que eu fui, tão distante do menino, do jovem, até do homem adulto que corria e jogava futebol e bebia e cheirava e fumava tanta coisa, morena, tanta loucura que eu fiz na vida, morena, que acabou estragando boa parte do meu corpo, morena, e hoje eu lamento que esteja aqui nessa situação, diante de você, morena, e de sua pergunta, tendo que me esquivar e no entanto não, querendo ao invés de esquivar me atirar, mas seria um perigo, morena, porque estou gastando a quilometragem do caminhão que meu coração move, e assim ele não chegará à Lua, como chegarão os caminhões dos tipos saudáveis e que além de saudáveis não se expõem a uma paixão louca assim, morena, como a que me movimenta em sua direção, não sei se você me entende, morena, se percebe o perigo que eu corro e, no entanto, morena, sim, eu te amo, morena, que se dane o caminhão para a Lua, que ele não chegue ao próximo quarteirão, eu me arrisco, morena, vale a pena, morena, que ele não ande dez metros, mas vai valer a pena morrer assim, morena, de amor... Sim, morena, sim!



Assine e apoie o blog que resiste há 18 anos, direto do Rio remando contra a maré.
Se preferir, faça uma doação via PIX para blogdomello@gmail.com

Assine o Blog do Mello