Antes de pedir indiciamento de Bruno de Luca no caso Kayky Brito, MP do Rio deveria ler Fernando Pessoa

O Ministério Público do Rio resolveu pedir o indiciamento do apresentador Bruno de Luca por omissão de socorro, no caso do atropelamento do ator Kayky de Brito em 2 de setembro.

O que diz a lei sobre omissão de socorro?

Art. 135 - Deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à criança abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública: Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.

Como falar em omissão de socorro se Kayky estava sendo socorrido por várias pessoas, inclusive pelo motorista que ele atropelou (pois foi o ator que veio correndo e atropelou o táxi e não o contrário)?

Os dois amigos estavam pra lá de Bagdá ou de Marrakech, como queiram, completamente doidões, como mostram as imagens abaixo.

Sabe-se lá o que passou pela cabeça de Bruno de Luca, doidão e transtornado, vendo o amigo atropelado. Bateu o desespero, como mostram as imagens, e ele num impulso resolveu sair dali, fugir. 

Se estivessem apenas os dois seria obrigação dele ajudar o amigo. Não era o caso.

Ele deveria ao menos prestar solidariedade, acompanhar o caso. Ou não ter mentido, como o fez no dia seguinte, quando disse que só ficou sabendo do atropelamento depois. Tudo isso é verdade. Mas nada disso é omissão de socorro.

Nesses tempos de julgamentos e cancelamentos pelo STRS (Supremo Tribunal das Redes Sociais) o MP do Rio poderia pensar duas vezes antes de propor um indiciamento desses, que certamente não vai dar em nada, apenas jogar mais lenha na fogueira das redes.

O MP deveria, antes,  ler o Poema em linha reta, de Álvaro de Campos / Fernando Pessoa ao menos como reflexão:

POEMA EM LINHA RETA

Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.

E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das
etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.

Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...

Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,

Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?

Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?

Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.

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