Imagem que ajudou a pôr fim a uma guerra pode ajudar a terminar outra

Num 8 de junho, há 52 anos, o fotógrafo vietnamita Nick Ut fez o registro de uma imagem que emocionou o mundo e contribuiu para fazer chegar ao fim a guerra do Vietnã.

A foto da menina nua chorando, desesperada, fugindo dos ataques vindos dos céus, de aviões estadunidenses criminosamente bombardeando napalm sobre civis vietnamitas, deu a Nick Ut os prêmios World Press Photo e Pulitzer. 

A menina, com 9 anos, é Phan Thị Kim Phuc, hoje embaixadora da Boa Vontade da Unesco, com 61 anos, e é dela esta narrativa sobre os acontecimentos que geraram a foto:

"Em 1972, os americanos lançaram uma bomba de napalm em meu povoado, no sul do Vietnã. Um fotógrafo, Nick Ut, tirou uma foto minha fugindo do fogo, a foto que hoje é tão famosa. Eu me lembro que tinha 9 anos, era apenas uma menina. 

Naquela noite, nós do povoado havíamos ouvido que os vietcongues estavam vindo e que eles queriam usar a vila como base. 

Então, quando já era dia, eles vieram e iniciaram os combates no povoado. Nós estávamos muito assustados. Eu me lembro que minha família decidiu procurar abrigo em um templo, porque nós acreditávamos que lá era um lugar sagrado. Nós acreditávamos que, se nos escondêssemos lá, estaríamos a salvo. 

Eu não cheguei a ver a explosão da bomba de napalm; só me lembro que, de repente, eu vi o fogo me cercando. De repente, minhas roupas todas pegaram fogo, e eu sentia as chamas queimando meu corpo, especialmente meu braço. 

Naquele momento, passou pela minha cabeça que eu ficaria feia por causa das queimaduras, que eu não ia mais ser uma criança como as outras. Eu estava apavorada, porque de repente não vi mais ninguém perto de mim, só fogo e fumaça. Eu estava chorando e, milagrosamente, ao correr meus pés não ficaram queimados. Só sei que eu comecei a correr, correr e correr. 

Meus pais não conseguiriam escapar do fogo, então eles decidiram voltar para o templo e continuar abrigados por lá. Minha tia e dois de meus primos morreram. Um deles tinha 3 anos e o outro só 9 meses, eram dois bebês. Então, eu atravessei o fogo."


O desespero no rosto da menina Kim Phuc vemos hoje refletido em várias crianças palestinas, maiores e menores que a pequena vietnamita fugindo do chão em brasa sob seus pés, do fogo que ameaçava devorá-la e queimava seus braços, porque o napalm gruda no corpo e só para de queimar quando o fogo se extingue.

Já são quase 15 mil crianças palestinas barbaramente assassinadas por Israel em sua estratégia genocida. Mais 33 mil crianças feridas. Elas me levam a Kim Phuc, que, mesmo fugindo do fogo do inimigo e da ameaça de morte, não deixou de pensar em seu corpo ferido, que "ficaria feia por causa das queimaduras, que eu não ia mais ser uma criança como as outras". Quantas crianças palestinas não compartilham esse drama?

O absurdo das guerras, desenhadas em salões refrigerados por homens bem remunerados e bem treinados, continua provocando morte, dor e horror nas crianças. Cabe a nós, adultos, fazermos o possível para que o genocídio pare já, que haja um cessar-fogo imediato.

Em homenagem a todas as Kim Phuc que já morreram, as que estão feridas, a todas essas crianças que atravessam correndo desesperadas por nossas telas, num grito apavorado por socorro, que não podemos deixar de prestar.

São quase 50 mil crianças palestinas entre mortas e feridas. Um estádio médio de futebol lotado. 

Que a imagem premiada do fotógrafo Nick Ut seja apenas, como a Itabira de Drummond, uma fotografia na parede ("Mas como dói!"), e que nunca mais haja oportunidade de um fotógrafo captar uma igual.


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