Petro: 'Os nazistas estão no poder no mundo'. Temos uma tarefa a fazer

O presidente da Colômbia Gustavo Petro recebeu na capital do país, Bogotá, a mais alta condecoração palestina, o Grande Colar do Estado da Palestina.

Em agradecimento, emocionado, fez um discurso histórico de 30 minutos em que afirma que os nazistas estão no poder no mundo e agem através do mercado financeiro, financiando guerras, comprando a mídia, em defesa da " economia fóssil".

 

"E o que Hitler propôs é o que está sendo aplicado em Gaza, mas como uma experiência para o mundo. É assim que eles querem nos dominar. As bombas em Gaza não são disparadas por simples soldados israelenses. É um capital enorme no mundo, centralizado, coordenado, que influencia os grandes governos. É por isso que vemos a França contradizer-se contra o seu próprio slogan. Liberdade, fraternidade, igualdade. Já se tinham contradito quando foram os negros do Haiti que levantaram esse mesmo slogan e levantaram a bandeira e a revolução haitiana, que é a mais importante de toda a América, também esquecida. Agora temos isso aqui. Os nazistas estão no poder. Eles sobem através do capital financeiro, conseguem liderar o governo dos Estados Unidos, mesmo que seja autoproclamado democrático, com correntes progressistas, mas esse progressismo jovem, negro, árabe, diverso, latino que está aí, não consegue mudar a vontade do Estado que continua ajudando a atirar as bombas."

tweet


Na íntegra de seu discurso, Petro desenvolve mais seu comentário. Trechos:

"Não é um acontecimento qualquer que estamos a testemunhar, são os novos sinais de um mundo terrível, mas também deve estar cheio de esperança. Não é um mundo como Fukuyama sonhou, sem contradições, totalmente pacífico. É um mundo profundamente pressionado pela política, talvez mais do que no século XX, que viveu duas guerras mundiais. que viveu a revolução socialista durante quase todo o século, a luta entre dois sistemas diferentes de compreensão do mundo, de compreensão da economia, de compreensão da sociedade, que poderia ter levado a uma terceira conflagração, sem dúvida, estivemos muito próximos dela, mas qual a responsabilidade mútua na União Soviética e nos Estados Unidos que já tinham sido aliados numa guerra, episódio por vezes desconhecido. Quando juntas decidiram lutar contra o fascismo, tanto a sociedade norte-americana como a sociedade soviética sabiam muito claramente que o seu inimigo não era um dos dois, que o seu inimigo era um terceiro partido que começava a avançar com uma espécie de espectro por toda a Europa daquela época, por todo o mundo, trazendo uma série de doutrinas criminosas que ganharam força e encheram a humanidade com uma de suas piores páginas. Custou cinquenta milhões de mortes para sair daquela situação e foram, sem dúvida, os soldados dos povos soviéticos e norte-americanos, que juntamente com muitos resistentes na Europa, dezenas de milhares de pessoas que pegaram em armas, que não concordaram com o fascismo, com a opressão absoluta, com o genocídio, e souberam resistir. Foi uma das grandes batalhas épicas da humanidade. A partir daí surgiu a palavra democracia, com mais força do que antes. E desses dois conglomerados que disputavam o poder mundial, surgiu a tese de uma sociedade de nações que se tornou a Organização das Nações Unidas e com ela a construção de algo que temos chamado de direito internacional."

(...)

"Esse mundo nascido depois de derrotar o fascismo está perecendo. Estamos vivendo seus estertores de morte. É um momento de morte que estamos vivendo. Chamei-lhe o 1933 global, porque em 1933 Hitler subiu ao poder na Alemanha. (...) Na Europa nada mais emergem do que fascistas que negam o seu próprio pensamento. Em Atenas, onde foi criada a palavra democracia, existe no fundo do mar a maior sepultura do planeta cheia de cadáveres, de pessoas que fogem de África para chegar à Europa para tomar um prato de sopa. A maior injustiça em terra, nos mares, onde se cruzaram os pensadores que falaram pela primeira vez no mundo da democracia e da república. Eles também falaram sobre tirania e oligarquias. Eles nos ensinaram os primeiros balbucios da política e a possibilidade de sermos espíritos livres, como os gregos ensinaram a toda a humanidade."

(...)

"Há uma experiência em curso, usando Gaza como laboratório. É uma experiência terrível que tem a ver com os nazistas. Os nazistas praticaram isso de pequenas maneiras. Relativamente e tentaram exterminar o povo judeu e o povo soviético e os povos democráticos e os socialistas e os comunistas e tudo o que lhes parecia diferente. Eles tiveram que ir para o campo de concentração e para a Câmara de Gás. A Europa morreu ali, nesses campos. E foi isso que Hitler propôs. Isto é o que está a ser aplicado em Gaza, mas como uma experiência para o mundo. É assim que eles querem nos dominar. É a maioria da humanidade que não vive sob o poder econômico global na Europa, no Japão ou nos Estados Unidos e que não está disposta a manter um status quo de injustiça absoluta, onde há vacinas contra a doença para alguns, mas para os pobres não há ou chegam tarde. Tal estado de injustiça, mesmo face à própria vida, aquilo que o filósofo Foucault certa vez chamou de biopolítica do poder. Por outras palavras, como pode o poder acabar com a vida de forma premeditada e generalizada e massiva? Como disse Hitler, é isso que estamos vendo hoje. Eles estão vivenciando isso em Gaza. As bombas em Gaza não são disparadas por simples soldados israelenses. É um enorme capital mundial, centralizado, coordenado, que influencia os grandes governos."

(...)

"As grandes potências mundiais estão subordinadas a um enorme capital financeiro cuja liquidez se baseia na economia fóssil que deve acabar no mundo. E apavorado com a ideia de uma mudança mundial, de uma revolução mundial, que é uma revolução para a vida, que não tinha acontecido antes na nossa história humana, mas que hoje é absolutamente essencial. Não temos escapatória porque o outro caminho é a morte da espécie, de todos os nossos filhos e dos nossos netos, porque numa economia fóssil o que morre é tudo, é o omnicídio. (...)  A ganância do capital não quer revelar a necessidade de transformação. Isso a impede constantemente. Ele faz lobby nas Nações Unidas, nos centros do poder mundial. Influencia os governos, financia-os. Não há campanha que eles não financiem. E então eles assumem o controle da política. E assim acabam com a liberdade da espécie humana. Eles cegaram-nos através dos seus meios de comunicação e o grande panóptico da humanidade, como disse Foucault, começa a ser gerido a partir de uma secretária num escritório frio no norte."

(...)

"É isso que temos de recuperar em Gaza. É lá que se trava a primeira das batalhas. Não será a última, e temos que nos preparar. Não há nenhuma razão ética ou moral que nos impeça de levantar a voz quando podemos e de agir quando podemos. Fracos somos, mas juntos somos humanidade. E temos que fazer essa união. Esta união deve ser construída entre todas as línguas de Babel, como diz a Bíblia. Na Bíblia há imagens do aparecimento do povo judeu e do povo muçulmano. Ambos semitas segundo a Bíblia, descendentes de Sem segundo a cronologia bíblica. Aqueles que nos criticam dizendo que somos antissemitas não têm a menor ideia sobre a Bíblia. Eles não a leram, porque se a lessem saberiam que naqueles livros antigos está a história dos dois povos sob o mesmo pai. Hoje eles têm que ser irmãos. De alguma forma você tem que encontrar o caminho. Se puderem ser irmãos, a humanidade terá encontrado o caminho para a fraternidade definitiva. (...) Uma paz que é revolucionária, não é uma guerra revolucionária, como falsamente acreditamos, é uma paz revolucionária. Yasser Arafat encontrou de alguma forma essa mensagem em sua existência e mudou a situação dizendo que os dois povos poderiam ser irmãos. Claro, sem tiranias. É claro que nas democracias puras a terra palestina pode viver na diversidade como sempre viveu. Porque é uma terra de diversidade, de crenças, é uma terra de liberdade. Jesus era um judeu palestino."

(...)

" A revolução mundial de hoje não levanta uma simples bandeira vermelha, por assim dizer. Pode ser vermelha, mas é a bandeira da vida que significa a bandeira revolucionária. Hoje é uma revolução de vida. É a tarefa que todos temos de tecer, de construir, de organizar. Eles nos chamarão de revolucionários, sim, mas temos orgulho disso, porque somos a expressão genuína de uma humanidade que não quer correntes, que não quer injustiças, que quer ser um espírito livre entre as estrelas. Obrigado pela sua condecoração. Minhas saudações e meu amor ao povo palestino."


Aqui a entrevista na íntegra:


Contribua com o blog que está com você há 19 anos
PIX: blogdomello@gmail.com