O amor tem dessas coisas. Berlim pode esperar

— Está difícil resistir, amiga!...

Foi assim, num misto quente de apreensão e encantamento, que Carol pôs um ponto final na história que contava para a amiga Lúcia sobre o assédio de um colega de academia, Luís, apelidado de Alemão.

Segundo ela, o Alemão era lindo. Um Apolo com propostas dionisíacas. Impossível resistir, caso... Caso ela não fosse casada há dez anos com Alfredo, seu primeiro namorado e único homem com quem tivera qualquer intimidade na vida. 

Além do mais, Alfredo era o homem perfeito. Todo certinho. Executivo num grande banco, ganhando muito bem. E mão aberta. Ela não podia arriscar um relacionamento desses por uma tentação. Por mais que a tentação tivesse 1,90m de altura, um corpo esculpido em horas diárias de academia e as palavras certas para dizer na hora idem.

— Parece besteira, romantismo, mas é como se a gente se conhecesse desde sempre. Os mesmos gostos. Curtimos os mesmos filmes, o mesmo tipo de música.

Além do mais, havia as coincidências. Se ela procurava mudar o horário de ir à academia, parecia que ele adivinhava e estava por lá, como se a aguardasse.

De vez em quando se encontravam sem querer num shopping. E até no cinema, quando foi ver um filme com a amiga Lúcia. Se encontraram na saída os três, tomaram um café juntos e, quando ele se despediu, a amiga concordou com a frase dela do início:

— É mesmo difícil resistir, amiga. Nem que fosse uma única vez, eu pegava.

— Mas você não é casada... e com o Alfredo, que é um amor.

— O Alfredo não precisa saber. Você vai contar pra ele? O Alemão vai? Eu vou? Então, aproveita, amiga.

— Você não está entendendo. Ele também me disse que não quer uma aventura. Quer que eu me separe do Alfredo. Que não gosta de traições e jamais me pediria isso. 

— Isso embaralha tudo, amiga... Aí tem que pensar mesmo... tantos anos de casada e um marido legal...

— O problema é que parece que o destino, sabe?.. Tem alguma coisa por trás que parece estar me atraindo... Sabe aquela série de coincidências? Vou num lugar, ele está lá. Mudo o horário, e ele muda junto, como se a gente tivesse combinado... Além do mais...

— ... Além do mais o Alemão é um cavalão de quase dois metros, um puro sangue pronto pra cavalgar e cavalgar...

E assim as duas amigas iam atualizando o status do Alemão sempre que se encontravam. E, para azar do Alfredo e sorte do Alemão, Alfredo andava pisando na bola. Chegava do trabalho cada vez mais tarde, com cheiro de bebida e cansado, muuuuito cansado.

Ao mesmo tempo, o Alemão estava sempre presente, com sugestão de uma cafeteria nova, um novo filme. Até a um cinema de mãos dadas eles foram. Não mais do que isso, porque o Alemão...

— Ele insiste que preciso me separar; sem isso, nada feito.

No fim, tudo foi mais fácil do que Carol pensou que seria. Alfredo reconheceu que o casamento estava num ponto de desgaste que já não valia a pena mesmo investir, e ele era especialista em investimento...  E o casal se separou, tudo certinho, bens divididos em comum acordo.

Carol estava super satisfeita, embora triste pelo fim do casamento, porque gostava do Alfredo. Mas o Alemão parecia um sonho...

Um sonho que viraria realidade naquela noite, no barzinho que sabiam existir mas onde nunca foram antes, porque estava reservado para ser o local certo do início da história dos dois: ambiente exclusivo, um trio de jazz, drinks e a vista do mar à noite...

Só que Carol esperou e o Alemão não apareceu. Ela ligou e estranhamente o recado era de que o número chamado estava fora da área de cobertura. O que teria acontecido?

A 12 quilômetros de altura, na primeira classe de um voo para Frankfurt e dali para Berlim, o Alemão e Alfredo comemoram o "enfim sós" com uma taça de champanhe. Tim, tim!

O amor tem dessas coisas.

Assine e apoie o blog que resiste há 18 anos, direto do Rio remando contra a maré.
Se preferir, faça uma doação via PIX para blogdomello@gmail.com

Assine o Blog do Mello