Pela 1ª vez na história, um diretor de jornalismo (Kamel) parabeniza equipe por barriga


Assim como Bolsonaro, Kamel cria fake news e "parabeniza editoria Rio" pela bola nas costas


Não é só o presidente (eleito mediante fraude) Bolsonaro que cria fake news para iludir seu público alimentado a mamadeira de piroca.

O diretor de Jornalismo da Globo, Ali Kamel, também é chegado a uma notícia falsa, até para sua equipe.

Depois da inacreditável barriga da Globo sobre o porteiro do "seu Jair" (que comentei aqui), Kamel, em vez de reconhecer o erro e dar a volta por cima, fazendo uma reportagem de fundo sobre o condomínio Vivendas da Barra, escreve uma carta à equipe do Rio [que reproduzo ao final], elogiando-os pela barriga cujo maior culpado, evidente, é Kamel.
No texto, Kamel diz que a Globo (que ele imperial confunde consigo mesmo, "jornalismo que pratico") fez tudo certo, estavam errados os fatos — no caso, os áudios que Carlos Bolsonaro mostrou no dia seguinte à reportagem pelo Twitter e que o advogado de Bolsonaro não lhe informara, quando ouvido sobre a reportagem.

Faltou apuração, embora Kamel tenha escrito certa vez aqui para o blog em 2006, que a Globo não põe nada no ar sem checar autenticidade. Mesmo recebendo de uma fonte credenciada. É zelo. É cuidado.

Como fica claro na carta à equipe que Kamel coordenou pessoalmente a reportagem, fica evidente que ele focou sua preocupação com o andar de cima, seus superiores, os Marinho, políticos amigos etc, em vez de botar a equipe para ir atrás de sua majestade os fatos.

Se o porteiro disse que falou duas vezes com "seu Jair" e ele estava (ao que tudo indica) em Brasília, por que não entrevistarem o porteiro? Por que não viram como funciona o serviço de comunicação da portaria com os condôminos? Há transferência pelo celular?

Porque até hoje há uma questão (além da possível manipulação dos dados da portaria por Bolsonaro): será que o interfone é a única forma de comunicação ou algum condômino, como Bolsonaro, pede para que seja informado por celular, caso não esteja no condomínio (já sugeri aqui que Bolsonaro abrisse mão do sigilo do seu para comprovar que não recebeu ligação do condomínio naquele dia), por exemplo?

Em vez de buscar corrigir a barriga, enviando equipe (a Globo tem centenas de repórteres)  e fazendo uma varredura investigativa no condomínio, Kamel passou a edição do dia seguinte do Jornal Nacional ajoelhado no milho, e hoje a imagem do jornalismo da Globo está ainda mais no chão do que antes.

Mas Kamel preferiu enviar uma carta à equipe, parabenizando-os, mimetizando Bolsonaro, que se jacta das merdas que faz.

"Fomos brilhantes, fizemos tudo certo, só estávamos errados e a matéria sobre o presidente deveria ter caído ou, o certo, mais bem apurada e aprofundada, antes de ir ao ar" (Terá sido por que a fonte tinha pressa, como Kamel diz na carta?).

Eis a carta de Kamel:
Há momentos em nossa vida de jornalistas em que devemos parar para celebrar nossos êxitos.
Eu me refiro à semana passada, quando um cuidadoso trabalho da editoria Rio levou ao ar no Jornal Nacional uma reportagem sobre o Caso Marielle que gerou grande repercussão. A origem da reportagem remonta ao dia 1° de outubro, quando a editoria teve acesso a uma página do livro de ocorrências do condomínio em que mora Ronnie Lessa, o acusado de matar Marielle. Ali, estava anotado que, para entrar no condomínio, o comparsa dele, Elcio Queiroz, dissera estar indo para a casa 58, residência do então deputado Jair Bolsonaro, hoje presidente da República. Isso era tudo, o ponto de partida.
Um meticuloso trabalho de investigação teve início: aquela página do livro existiu, constava de algum inquérito? No curso da investigação, a editoria confirmou que o documento existia e mais: comprovou que o porteiro que fez a anotação prestara dois depoimentos em que afirmou que ligara duas vezes para a casa 58,  tendo sido atendido, nas palavras dele, pelo “seu Jair”. A investigação não parou. Onde estava o então deputado Jair Bolsonaro naquele dia? A editoria pesquisou os registros da Câmara e confirmou que o então deputado estava em Brasilia e participara de duas votações, em horários que tornavam impossível a sua presença no Rio. Pesquisou mais, e descobriu vídeos que o então deputado gravara na Câmara naquele dia e publicara em suas redes sociais. A realidade não batia com o depoimento do porteiro.
Em meio a essa apuração da Rio (que era feita de maneira sigilosa, com o conhecimento apenas de Bonner, Vinicius, as lideranças da Rio e os autores envolvidos, tudo para que a informação não vazasse para outros órgãos de imprensa), uma fonte absolutamente próxima da família do presidente Jair Bolsonaro (e que em respeito ao sigilo da fonte tem seu nome preservado), procurou nossa emissora em Brasilia para dizer que ia estourar uma grande bomba, pois a investigação do Caso Marielle esbarrara num personagem com foro privilegiado e que, por esse motivo, o caso tinha sido levado ao STF para que se decidisse se a investigação poderia ou não prosseguir. A editoria em Brasilia, àquela altura, não sabia das apurações da editoria Rio. Eu estranhei: por que uma fonte tão próxima ao presidente nos contava algo que era prejudicial ao presidente? Dias depois, a mesma fonte perguntava: a matéria não vai sair?
Isso nos fez redobrar os cuidados. Mandei voltar a apuração quase à estaca zero e checar tudo novamente, ao mesmo tempo em que a Editoria Rio foi informada sobre o STF. Confirmar se o caso realmente tinha ido parar no Supremo tornava tudo mais importante, pois o conturbado Caso Marielle poderia ser paralisado. Tudo foi novamente rechecado, a editoria tratou de se cercar de ainda mais cuidados sobre a existência do documento da portaria e dos depoimentos do porteiro. Na terça-feira, dia 29 de outubro, às 19 horas, a editoria Rio confirmou, sem chance de erro, que de fato o MP estadual consultara o STF.
De posse de todas esses fatos, informamos às autoridades envolvidas nas investigações que a reportagem seria publicada naquele dia, nos termos em que foi publicada. Elas apenas ouviram e soltaram notas que diziam que a investigação estava sob sigilo. Informamos, então, ao advogado do presidente Bolsonaro, Frederick Wassef, sobre o conteúdo da reportagem e pedimos uma entrevista, que prontamente aceitou dar em São Paulo. Nela, ele desmentiu o porteiro e, confirmando o que nós já sabíamos, disse que o presidente estava em Brasília no dia do crime. Era madrugada na Arábia Saudita e em nenhum momento o advogado ofereceu entrevista com o presidente. 
A reportagem estava pronta para ir ao ar. Tudo nela era verdadeiro: o livro da portaria, a existência dos depoimentos do porteiro, a impossibilidade de Bolsonaro ter atendido o interfone (pois ele estava em Brasilia) e, mais importante, a possibilidade de o STF paralisar as investigações de um caso tão rumoroso. É importante frisar que nenhuma de nossas fontes vislumbrava a hipótese de o telefonema não ter sido dado para a casa 58. A dúvida era somente sobre quem atendeu e só seria solucionada após a decisão do STF e depois de uma perícia longa e demorada em um arquivo com mais de um ano de registros. E isso foi dito na reportagem. Quem, de posse de informações tão relevantes, não publica uma reportagem, com todas as cautelas devidas, não faz jornalismo profissional.
Hoje sabemos que o advogado do presidente, no momento em que nos concedeu entrevista, sabia da existência do áudio que mostrava que o telefonema fora dado, não à casa do presidente, mas à casa 65, de Ronnie Lessa. No último sábado, o próprio presidente Bolsonaro disse à imprensa: “Nós pegamos, antes que fosse adulterada, ou tentasse adulterar, pegamos toda a memória da secretária eletrônica que é guardada há mais de ano".
Por que os principais interessados em esclarecer os fatos, sabendo com detalhes da existência do áudio, sonegaram essa informação? A resposta pode estar no que aconteceu nos minutos subsequentes à publicação da reportagem do Jornal Nacional.
Patifes, canalhas e porcos foram alguns dos insultos, acompanhados de ameaças à cassação da concessão da Globo em 2022, dirigidos pelo presidente Bolsonaro ao nosso jornalismo, que só cumpriu a sua missão, oferecendo todas as chances aos interessados para desacreditar com mais elementos o porteiro do condomínio (já que sabiam do áudio).
Diante de uma estratégia assim, o nosso jornalismo não se vitimiza nem se intimida: segue fazendo jornalismo. É certo que em 37 anos de profissão, nunca imaginei que o jornalismo que pratico fosse usado de forma tão esquisita, mas sou daqueles que se empolgam diante de aprendizados. No dia seguinte, já não valia o sigilo em torno do assunto, alegado na véspera para não comentar a reportagem do JN antes de ela ir ao ar. Houve uma elucidativa entrevista das promotoras do caso, que divulgamos com o destaque merecido: o telefonema foi feito para a casa 65, quem o atendeu foi Ronnie Lessa, tudo isso levando as promotoras a afirmarem que o depoimento do porteiro e o registro que fez em livro não condizem com a realidade. O Jornal Nacional de quarta exibiu tudo, inclusive os ataques do presidente Bolsonaro ao nosso jornalismo, respondidos de forma eloquente e firme, mas também serena, pela própria Globo, que honra a sua tradição de prestigiar seus jornalistas. Estranhamente, nenhuma outra indagação da imprensa motivada por atitudes e declarações subsequentes do presidente foi respondida. O alegado sigilo voltou a prevalecer.
Mas continuamos a fazer jornalismo. Revelamos que a perícia no sistema de interfone foi feita apenas um dia depois da exibição da reportagem e num procedimento que durou somente duas horas e meia, o que tem sido alvo de críticas de diversas associações de peritos.
Conto tudo isso para dar os parabéns mais efusivos à editoria Rio. Seguiremos fazendo jornalismo, em busca da verdade. É a nossa missão. Para nós, é motivo de orgulho. Para outros, de irritação e medo.
Ali Kamel


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